Desde que saímos de Goiânia, penso nas inúmeras jornadas literárias que uma viagem como esta pode proporcionar, mesmo se o viajante se limitar ao sul da Itália.
É impossível a imersão em todas elas, mas posso construir quadros mentais sobre a presença de escritores, poetas e jornalistas que aqui nasceram ou nos talentos que elegeram essa região como seu refúgio.
Na minha mente ainda ressoa a frase de Goethe que vi na entrada de um edifício em Nápoles: “nunca serei completamente infeliz enquanto puder voltar a Nápoles em pensamento."
Tenho a sorte de precisar voltar a Nápoles para devolver o carro alugado, antes de pegar o trem para Roma, de onde retornaremos a Goiânia.
Mergulho na história de tantos escritores que escreveram sobre o sul da Itália.
São muitos os nativos e visitantes que se apaixonaram pela região, alguns alimentando uma visão ácida do mundo e outros, um olhar mais doce.
Gostaria de me inscrever na lista dos que se encantaram pelo lugar como o alemão Goethe, o francês Alexandre Dumas, o norueguês Henrik Ibsen, os norte-americanos Mark Twain e Truman Capote; e os brasileiros Afonso Arinos e Murilo Mendes.
A lista dos nascidos aqui é surpreendente e conta com nomes como Torquato Tasso, Giacomo Leopardi, Tomasi di Lampedusa, Luigi Pirandello, Giovanni Verga e Elena Ferrante.
Torquato Tasso, o genial autor de “Jerusalém Libertada” – um dos livros mais lidos até o final do século XIX, nasceu em Sorrento, em 1544 e sofreu de transtornos psicológicos, chegando a ser internado em um hospital psiquiátrico.
Em Sorrento, foi feita uma homenagem ao ilustre poeta na forma de uma estátua erguida em sua memória na praça que leva seu nome.
O poeta atormentado dizia que, além de ter sido seu refúgio materno, a casa onde ele passou a infância em Sorrento lhe permitia a calma vista do Golfo de Nápoles, donde se pode contemplar a vizinha cidade e o Vesúvio do outro lado do mar:
“Nápoles é uma bela cidade, que é quase um remédio para a minha dor".
Recém-chegado a Siracusa, eu penso em todos esses escritores e como a região influenciou fortemente suas obras. É como se eu ouvisse o eco dessas vozes antigas a me acompanhar nesta viagem.
Creio que a arte da escrita tem a ver com a habilidade em traduzir o pensamento puro em uma forma que possa encantar o leitor. Ao longo da história, a paisagem influenciou muitos escritores e os levou a encontrar um caminho para a expressão: uma forma de dizer.
Tudo isso se torna mais palpável quando a natureza se exibe tão atrativa, com cores marcantes como as do Sul da Itália e, sobretudo, da Sicília.
O impacto da paisagem não se restringe apenas à sua beleza visual, mas se estende à atmosfera emocional que ela evoca.
Os raios do sol, a cor das plantações de limão siciliano, o movimento das ondas, o visual do mar e a brisa marinha são elementos que podem moldar o estado de espírito do escritor, deixando sua marca nas narrativas ou nos poemas.
É essa a singularidade que diferencia a literatura inspirada por essa região italiana.
Bom ler isso. Morei muitos anos em Roma, com incursões frequentes ao sul do país - fossem elas deslocamentos “in macchina” ou a simples leitura de um livro. Ainda não havia Ferrante, mas a região já era muito bem representada. Acrescentaria à lista de nativos Malaparte e Levi; e à de visitantes, Stendhal (afinal, Roma é praticamente sul). Ah, sim, antes de me mudar, li o livro Afonso Arinos com o delicioso palíndromo no título: AMO ROMA. Abs