Por Adalberto de Queiroz, publicado originalmente em O POPULAR (Goiânia), 09/09/2024.
Se no mês de maio é o tamboril de meu jardim que estica os braços desejoso de alcançar uma nesga do doce algodão dos céus, em agosto e setembro são os ipês de nossa cidade que parecem se pavonear numa grita geral contra a secura e o calor.
Amanhecem todos vestidos da roupa domingueira das flores, num festival de tons amarelo, roxo, rosa e branco; sim, isso mesmo, porque até os tons de branco têm nuances.
É como se estivéssemos assistindo a um concerto combinado desses filhos da natureza que parecem nos comunicar algo sobrenatural e que são um contraponto eficaz contra a secura, a desolação e a ansiedade.
Muito da nossa ansiedade é gerada pelas agruras do dia a dia – problemas no trabalho, calor excessivo, doenças em família, contas a pagar, juros escorchantes para financiar os sonhos – e, recentemente, pelos desentendimentos políticos e as relações sociais fracionadas, potencializados pelos exageros das mídias sociais.
Mais do que a ansiedade, o medo pode ser paralisante. Contra este, cabe a lição de João Paulo II: “a maior falta do apóstolo é o medo. O que desencadeia o medo é a falta de confiança na força do Mestre; é esta que oprime o coração e aperta a garganta...”
E ele continua: “a história do homem desenvolve-se em dimensão horizontal no espaço e no tempo; mas é atravessada também por uma dimensão vertical”. Se quem escreve a história não são apenas os homens, devemos repetir para nós mesmos, contra toda a ansiedade do momento presente que, também conosco, Deus escreve a história.
Essa dimensão transcendente pode ser a garantia de enxergarmos um pouco além dos limites da visão estreita, contando com o apoio do “Deus da promessa”, desde os tempos do patriarca judeu Abraão, um homem que acreditou e lutou contra toda a desesperança.
Alguma ansiedade é natural no trato com as coisas do mundo, com o dia a dia das experiências individuais e coletivas, com o relacionamento na esfera social. Só no cemitério, encontra-se quem não tenha ansiedade.
Diante dessa demonstração cíclica do tempo, que alterna chuva e seca na maior savana do planeta e nos provê um espetáculo tão eloquente como agora, é preciso aprender a lição das floradas diante da aridez.
Em meio ao cerrado seco e pintado de cor palha, lá estão os ipês, atestando a força da natureza e a beleza do Criador em seu testemunho silencioso, diante de nossas retinas preguiçosas e desatentas; diante dos 18% de umidade relativa, que nos afeta a garganta e o humor.
Eu me consolo ao pensar que muito antes dos carros e do ar-condicionado os valentes cidadãos do cerrado tiveram perseverança e fé para desbravar e construir, sob o sol e a poeira inclemente dessas terras, o lugar em que hoje vivemos. Isso nos conforta um pouco.
E o exemplo dos antepassados certamente nos reforça a esperança de viajantes e cidadãos desta savana e do planeta; mesmo quando nos sentimos com nossas almas desfolhadas. Devemos acreditar na chuva que certamente virá. E assim como a chuva, a esperança e a fé nos levarão a tempos melhores.